Qual é a importância?...


Não adianta mentir, todo mundo tem algum tipo de preconceito intrínseco. É maldade, é errado. Mas é verdade. O que não pode acontecer é você ter algum preconceito feio e sem fundamentos, como de etnia, crença, orientação sexual ou nacionalidade.

Eu também tenho um preconceito, então e pedi licença ao autor deste blog para assumir minha culpa. Como ele é um rapaz muito simpático, me cedeu o espaço. ;) Lá vai: não gosto de gente burra. Antes de me apedrejar, escute o argumento. Não estou me referindo a sujeitos sem estudos, grau de instrução. Exatamente o oposto! Meu problema é com gente muito bem diplomada, que estufa o peito, tal qual um Chester na ceia de Natal, porém, quando muito, não passa de um franguinho assado.

Dia desses conferi uma entrevista numa grande rede de notícias. O repórter conversava com uma especialista em mercado de trabalho e eis que lança a intrigante pergunta: "qual é a importância das férias?" Se sou eu, a resposta seria bastante direta: "descansar. Próxima". Ele sinceramente esperava alguma informação mais relevante?

Sei que não sou ninguém para julgar jornalistas mais experientes, afinal acabei de terminar o primeiro ano do curso. Sou um Zé Ruela, fato. Mas, além de estar me esforçando para aprender e fazer um bom trabalho, também tenho reparado nos profissionais ao meu redor. Parece que a maioria deles tem preguiça de se preparar para realizar uma entrevista realmente decente. E não estou falando de técnicas de abordagem ou algo do tipo. É falta de feeling mesmo. Ler sobre assunto antecipadamente, para não fazer papel de ignorante na frente de sua fonte.

Descobri que dificilmente uma pergunta que começa com "qual é a importância" vai dar algum resultado impactante, porque é comum que fato/evento, por si só, já divulgue o motivo pelo qual é importante. A premissa é a mesma se a interrogação começar com "qual é o limite". Você não está sendo inteligente só porque deu ares de Marília Gabriela, jogando a cabeça para trás e forçou as sílabas tônicas das palavras enquanto fazia a pergunta, acredite. Talvez esteja até passando vergonha.

Nos tempos em que trabalhei com a literatura de Monteiro Lobato ouvi mil acusações contra o autor, afirmando que era preconceituoso e que um dos livros de sua coleção deveria ser excluído nas educação básica das escolas brasileiras. Em Caçadas de Pedrinho, "Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou que nem uma macaca de carvão pelo mastro de São Pedro", nas palavras do taubateano. Em minha humilde opinião, isto não pode ser considerado preconceito na cultura brasileira de 1933, época de publicação do livro. Sobretudo levanto em consideração que o autor nasceu em 1882, seis anos antes da abolição da escravatura no país.

Por outro lado, Lobato, o "preconceituoso" que chegou a viver numa fazenda cafeeira cheia de escravos, em "Memórias da Emília" (1936), descreve Nastácia como "(...) a ignorância em pessoa. Isso é... Ignorante, propriamente, não. Ciência e mãos coisas dos livros, isso ela ignora completamente. Mas nas coisas práticas da vida, é uma verdadeira sábia. (...) Só não compreendo por que Deus faz uma criatura tão boa e prestimosa nascer preta como carvão. É verdade que as jabuticabas, as amoras, os maracujás também são pretos. Isso me leva a crer que a tal cor preta é uma coisa que só desmerece as pessoas aqui neste mundo. Lá em cima não há essa diferença de cor. Se houvesse, como havia de ser preta a jabuticaba, que para mim é a rainha das frutas?".

Quem dera o mundo de hoje fosse mais cheio de tias Nastácias. Pessoas "burras" de livros, mas sábias de coração. Com certeza seriam do tipo que já sabem a importância das coisas sem ao menos precisar questioná-la. E, com perguntas menos óbvias, teríamos acesso a informações mais valiosas. Um mundo com mais Chestermenos frango assado! :D



Boa noite, vizinhança


Na minha rua tem uma casa com o muro muito baixo. Mais de uma, na verdade, mas essa se destaca por seus moradores. Poucas foram as vezes que passei em frente a esta curiosa residência e não tinha ali um cidadão, parado, com a cabeça numa altura acima dos tijolos, espiando o que acontece do lado de fora. Está certo que há anos a expressão afirma que a grama do vizinho é sempre mais verde. Mas é mesmo assim, tão imprescindível, a ficar observando crescer?

Aceita que dói menos: a gente mora no centro! Do lado de fora não tem grama. Não tem nem uma erva daninha sequer! Do lado de fora só tem asfalto e carros passando a uma velocidade lancinante desde que arrancaram aquela saudosa lombada nos anos 90.

Mais adiante vive uma vizinha que só me cumprimenta quando quer. Não me pergunte quais são os parâmetros adotados por ela para decidir se hoje é ou não um bom dia para botar as boas maneiras para jogo. Nós temos praticamente a mesma idade e eu a conheço (de vista) desde pequenos. Até sei identificar quem é ela e quem é sua irmã, por mais que as duas sejam prova irrefutável de que Ctrl C + Ctrl V não é apenas um comando no seu teclado. Ainda assim, ela não sabe valorizar esta minha pequena-grande proeza e muitas vezes me ignora.

Nem sofro.

Sei que pode parecer que não estou dizendo a verdade, mas é sério. Juro. Só acho que a política da boa vizinhança não custa nada. Mas, tudo bem, eu posso conviver com isso e meu coração continua aberto. Afinal, foi acompanhando a vida de um outro grupo de vizinhos excêntricos que aprendi que "a vingança nunca é plena: mata a alma e a envenena" e que "as pessoas boas devem amar seus inimigos".

Num mundo em que a falta de argumentos leva as pessoas a compararem e discutirem agressivamente sobre duas grandes tragédias, não era de se esperar uma postura menos individualista. O debate é sempre solitário, nas redes sociais. Nunca olho no olho. Seria estranho demais.

E aí, qual foi pior? Mariana ou Paris?

Vamos combinar uma coisa: dor, perda e sofrimento não se medem, está certo? Portanto, em vez de comparar as duas situações, opte por não dizer nada. É como diz o velho ditado, "melhor ficar calado e deixar que as pessoas pensem que você é um idiota, do que abrir a boca e acabar com a dúvida".

Em todo caso, se resolver expor o que pensa, talvez seja melhor começar numa esfera um pouco mais reduzida. Olhando ao seu redor. Conhecendo quem está ao seu lado todos os dias e nem ao menos é notado. Pode ser este o caminho para que a realidade comece a mudar e possamos evitar dramas tão terríveis, causados unicamente pelo egocentrismo humano. Como aqueles mostrados nos noticiários ultimamente.

Bom mesmo seria se trocássemos a casa de parede baixa por um barril, as irmãs idênticas por 14 meses de aluguel e o asfalto da rua por um pézinho de cherimoia. De repente, assim, a gente levava a galera toda para umas férias em Acapulco e todo mundo aprendia a dizer "bom dia" e a interagir de verdade uns com os outros. Como pessoas, sabe? E não como artigos estranhos e desconhecidos numa feira qualquer no Marrocos.

Deve ser melhor do que só espiar o movimento por cima do muro...



Assento Vago


Alguma vez você já se sentiu um estranho no ninho? Isso acabou de acontecer comigo num dos lugares menos prováveis: dentro de um ônibus. A notória surpresa veio quando a quantidade de passageiros já era grande. Tinha gente até em pé, mas ninguém sentado ao meu lado.

Não que eu faça questão. Ainda mais em se tratando de fim de expediente. Por motivos olfativos, como qualquer bom trabalhador deve suspeitar. Mas, poxa, ver o lugar vago e, ainda assim, preferir uma viagem de 30 minutos em pé é sacanagem! Deveria ser considerado ato inconstitucional. Pelo menos na pátria da pessoa que ficou com um assento vago para repousar seu orgulho ferido.

Mas também, quais eram minhas opções? Uma menina verdadeiramente baixinha e um sósia do David Luís. Gentes boas, eu sei. Bom, pelo menos imagino, já que não tive a oportunidade de os conhecer. Por opção deles, não minha. Eu estava ali o tempo todo, só eles não viram. E perderam a honra de se sentarem ao meu lado e ter um agradável diálogo quebra-gelo com um desconhecido rumo à Caçapava (coisa que eu, particularmente, adoro. Mas não).

No momento em que já estava programando cursar Engenharia como minha próxima faculdade, só para ter o privilégio de projetar um ônibus onde apenas existam assentos unitários, sem vizinhos, percebi que já estava próximo ao ponto no qual eu desceria. Pedi licença à menina sentada ao meu lado, levantei, puxei a cordinha e...

Ops. Pausa dramática. Há quanto tempo ela já estava ali?



Moral da história: Acho que preciso parar de escrever tanto em lugares inusitados e me atentar mais ao mundo real.